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segunda-feira, 16 de março de 2015

Aero Willys - O luxo americano

O Aero-Willys e suas versões Itamaraty e Executivo
estão entre os nacionais mais sofisticados de seu tempo

A Willys nasceu em 1907, com a compra da Overland Automobile Company -- sediada em Indianópolis, Indiana, nos Estados Unidos -- por John North Willys, bem-sucedido empresário e presidente da American Motor Car Sales, representante de diversas marcas de automóveis.

O novo empresário conseguiu reequilibrar as contas da empresa, já que a Overland passava por momentos de escasso dinheiro em caixa. Com melhorias de produção, também devido a acordos com a Pope Company, houve uma mudança de nome: passou a se chamar Willys Overland Company.

Depois de afetada pela crise mundial dos anos 30, a Willys apresentou nos EUA, em 1940, o utilitário General Purpose -- que ganharia o mundo com a transcrição fonética das iniciais GP, ou seja, Jeep


Surgia então seu primeiro automóvel, um pequeno quatro-cilindros. Em 1909 lançava outros dois carros, ambos de seis cilindros e grandes dimensões, que não obtiveram muito êxito comercial. Dessa forma, a Willys concentrava sua produção nos modelos de quatro cilindros. A crise por que passou nos anos 20 fez com que a Willys Corporation adquirisse um terço da ações da Willys Overland Company. Em 1929, John North Willys deixava a companhia e o mundo automobilístico.

No inicio da década de 30 a empresa era afetada também pela crise mundial. Sua produção resumia-se a apenas um modelo, chamado de 77, que conseguiu dar fôlego à Willys até o início da Segunda Guerra Mundial. Em 1940 era apresentado o General Purpose Vehicle, veículo para uso geral, destinado às forças armadas do exército norte-americano. O General Purpose ficou conhecido anos mais tarde como Jeep, transcrição fonética em inglês das iniciais da expressão -- GP.

Em 1952 surgia a ampla linha Aero, composta pelo Lark (foto), Wing, Ace e Eagle em diversas versões de carroceria: serviriam de base para o Aero nacional

Anos depois do fim da Segunda Guerra, em 1948, Clyde Paton, ex-engenheiro-chefe da Packard, e Phil Wright davam início ao projeto daquilo que seria o futuro Aero-Willys. Paton tentou antes vender seu projeto para a Nash e a Packard, mas ambas recusaram e mais tarde ele o ofereceu para a Willys, sendo aceito. O projeto do Aero teve início em 1950 -- a denominação devia-se a sua estrutura monobloco, comparada aos mais modernos aviões a jato, que recebiam a denominação deaero frame.

Em 1952 eram apresentados ao público norte-americano os modelos Lark, Wing, Ace e Eagle. Podiam ser equipados com motores de quatro e seis cilindros, carrocerias de duas ou quatro portas, vidros traseiros panorâmicos ou não, versões cupê com ou sem colunas centrais. No ano seguinte a Willys Motor Company entrava em grave crise financeira, sendo obrigada a se tornar subsidiária da Kaiser-Frazer Corp., do grupo Kaiser Industries. Com a fusão, os modelos Aero passavam por mudanças de mecânica: ofereciam opcionalmente motores Kaiser, câmbio automático Hydramatic e direção assistida -- itens que, infelizmente, nunca chegariam aos modelos feitos no Brasil.

O modelo cupê  Bermuda não chegou ao Brasil, mas sua frente foi utilizada no sedã produzido em São Bernardo do Campo, SP

Mas de ano em ano as vendas vinham caindo. O consumidor norte-americano, como se sabe, gosta de automóveis grandes e para os padrões locais o Aero era considerado compacto. Os modelos foram fabricados até 1955, quando estavam reduzidos aos modelos Custom de quatro portas e Bermuda de duas portas. Durante os três anos em que foram produzidos, foram feitos 92.046 Aeros.

A Willys chega ao Brasil   A Willys Overland do Brasil S.A. foi fundada em 26 de abril de 1952, em São Bernardo do Campo, em São Paulo. Iniciou atividades em 1954 com a montagem do Jeep Willys, que aqui recebeu o nome de Jeep Universal. Esse modelo logo se destacou por sua robustez e valentia, já que as estradas na época eram precárias -- isso quando havia estrada. Em 31 de janeiro de 1958 era produzido o primeiro motor a gasolina para carros de passeio.

Capô e porta-malas mais baixos que os pára-lamas, ampla área envidraçada, perfil aerodinâmico: o desenho do Aero-Willys era bem atual em seu lançamento, em 1960

Com a política de incentivo dado pelo governo, a Willys e a Renault firmaram contrato para a fabricação do Dauphine, de grande sucesso no mercado francês. Em 1960, com quatro anos de existência, a industria automobilística nacional ainda contava com poucos modelos. Entre os mais baratos destacavam-se o Volkswagen Sedan (o Fusca) e o próprio Dauphine. O segmento de carros de luxo o segmento era composto pelo Simca Chambord e o FNM JK, uma cópia do Alfa Romeo 2000 italiano.



O Aero-Willys brasileiro foi apresentado em 25 de março de 1960, com índice de nacionalização de 85,3%. Era muito parecido aos modelos Aero Wing norte-americanos, mas trazia alguns detalhes dos modelos Custom, como a grade dianteira, lanternas e frisos. Um sedã de quatro portas, possuía características inovadoras para o mercado brasileiro, como o perfil aerodinâmico, cofre do motor e porta-malas mais baixos que os pára-lamas e grande área envidraçada


No interior era possível levar seis ocupantes com relativo conforto. O motor era o mesmo usado no Jeep Universal, um seis-cilindros em linha de 2,6 litros, que desenvolvia 90 cv brutos a 4.000 rpm; o câmbio tinha três marchas. Para 1962, os Aeros recebiam alterações como rodas e calotas, frisos laterais, painel estofado, cores e detalhes interiores. Em setembro daquele ano era apresentado o Aero-Willys 2600 modelo 63: totalmente redesenhado por estilistas brasileiros, foi mostrado ao público com sucesso no III Salão do Automóvel, em São Paulo.


A linha 1962 já recebia pequenos aprimoramentos; o motor de 2,6 litros e 90 cv brutos era o mesmo do Jeep, pouco adequado a um sedã de seu nível

Sua estrutura era a mesma do modelo anterior, mas com carroceria inteiramente nova. O motor era o seis-cilindros, agora alimentado por dois carburadores acoplados a um novo coletor de admissão, o que elevou sua potência para 110 cv brutos a 4.400 rpm. No interior o painel revestido de madeira jacarandá trazia três mostradores de funções acopladas, acendedor de cigarros dentro do cinzeiro e limpador de pára-brisa elétrico.

A Willys sabia que o ponto alto do desenho do Aero era sua traseira e, nos modelos 65, os desenhistas resolveram encompridá-la, para dar mais harmonia ao desenho. Inverteram a posição das lanternas e a tampa do porta-malas recebeu outro estilo, seguindo o desenho reto da carroceria. Entre itens mecânicos, foram aperfeiçoados os freios, com a colocação de tambores mais leves, a suspensão dianteira e o câmbio, de quatro marchas sincronizadas. Como nos modelos de três marchas, a alavanca ficava na coluna de direção. A trava de ré era liberada por um botão no centro da manopla.



O estilo era totalmente refeito para 1963, ganhando linhas mais retas e agressivas; o motor passava a 110 cv e havia revestimento de jacarandá no painel

Ainda em 1965, para disputar o mercado de carros de luxo, a Willys decidiu criar uma versão mais sofisticada. Usando como base o Aero, foram feitas modificações para que esse modelo se diferenciasse e conquistasse um público mais refinado. O novo carro foi lançado em 1966 e batizado de Itamaraty, uma alusão ao palácio homônimo sediado em Brasília.

Diz a história que quem criou o nome Itamaraty foi o publicitário Mauro Salles, um entusiasta de automóveis, que naquele momento deixava o jornalismo especializado e fundava a própria agência de publicidade. Seria um duradouro período atendendo a Willys Overland do Brasil, passando por sua sucessora, a Ford brasileira, e chegando à Autolatina -- nome também criado pelo inventivo Mauro Salles.


Ponto alto de seu desenho, a traseira do Aero-Willys ficava mais comprida e elegante na linha 1965; o câmbio ganhava a quarta marcha

As mudanças estéticas davam aparência mais agradável ao carro: nova grade dianteira, lanternas, sobre-aros cromados nas rodas. No interior trazia bancos revestidos de couro, rádio com dois alto-falantes, luzes de leitura e painel revestido de jacarandá maciço, que pesava 20 kg. Já na linha 1966 a Willys fazia mudanças na parte mecânica, como pistões autotérmicos, anéis de menor altura e novas buchas nos mancais do motor, além da utilização de alternador no lugar do dínamo.

Apesar dos aprimoramentos, o velho motor do Jeep não era adequado a um carro de luxo. No segundo ano de produção do Itamaraty, 1967, surgia quase um novo carro: o motor 3000, com 3,0 litros e alimentado por um carburador de corpo duplo, desenvolvia 132 cv 
brutos a 4.400 rpm, o que melhorava muito o desempenho do automóvel. Para celebrar as modificações mecânicas, a grade foi novamente modificada, as lanternas traseiras passaram a ser totalmente utilizadas com seis lâmpadas, os pneus eram agora 7,35-15 e os frisos externos vinham redesenhados.


O modelo 1966 foi um dos últimos antes da absorção da Willys pela Ford, que
traria motores mais potentes -- de 130 e 140 cv brutos -- para o Aero e o Itamaraty


Ocupando a quarta posição na fabricação de veículos, a Willys começava a despertar interesse em outras marcas. Ainda em 1967 a Ford adquiria o controle majoritário das ações da Willys Overland. Com a absorção da empresa, em 1969 a razão social era alterada para Ford-Willys do Brasil S.A. E nesse ano a influência da Ford começava a ser sentida nos produtos Willys: Aero e Itamaraty recebiam motores mais potentes, com 130 e 140 cv brutos, na ordem.

Esteticamente não foram feitas grandes modificações -- o Aero mantinha a frente inalterada, ganhando novos freios e estofamento. O Itamaraty perdia o painel de jacarandá, que passava a vir com imitação em plástico. E sofrendo concorrência interna com a chegada do Galaxie, as vendas dos modelos começavam a declinar ano a ano, apesar das reduções de preço feitas pela Ford.


O Itamaraty 1967: a versão de luxo do Aero tinha nova grade, painel em jacarandá e motor de 3,0 litros e 132 cv brutos, bem mais adequado a seu perfil
A despedida do Aero e de sua versão de luxo deu-se em 1971. Durante os 19 anos de produção, foram feitos 99.621 Aero-Willys e 17.216 Itamaratys -- o motor de 3,0 litros, porém, seria usado dois anos depois no Maverick. Com o fim dos dois modelos, desapareciam dois ícones dos primeiros anos da indústria automobilística brasileira.O Executivo   Apresentado em 1966 durante o V Salão do Automóvel, nessa época realizado no Pavilhão do Ibirapuera, a limusine Itamaraty Executivo chamou a atenção dos visitantes e da imprensa especializada, que há tempos vinha especulando sobre uma possível inserção da Willys nesse mercado.

Nessa época as poucas limusines que rodavam no País eram de origem estrangeira, a maioria de procedência norte-americana, como Cadillac e Lincoln. Foi nesse cenário que o então presidente da Willys do Brasil, Edgar Kaiser, lançou o desafio de produzir um carro que se fosse construído em pequena escala e usado por autoridades e empresários abonados, o que traria mais prestigio à marca.


A limusine Executivo, construída em parceria com a Karmann-Ghia, media 5,52 metros e
foi o primeiro nacional com ar-condicionado -- apenas para o compartimento traseiro

Usando como base o Itamaraty, a Willys fez algumas modificações na carroceria. Em parceria com a Karmann-Ghia, foram feitas mudanças estruturais que consistiam na inclusão de alguns centímetros entre as portas dianteiras e traseiras e também no porta-malas. Vale salientar que parte do ganho de espaço foi obtido graças à limitação de ajuste do banco do motorista, já que seria ocupado por um chofer e não pelo proprietário do carro.

A limusine tinha 5,52 metros de comprimento e mecânica igual à do Itamaraty, ou seja, motor de seis cilindros em linha e três litros. Foi apresentada em duas versões de acabamento: básica e Especial. Na primeira o espaço era para cinco passageiros, pois permitia levar três pessoas no banco convencional e mais duas pessoas nos pequenos bancos escamoteáveis situados nas laterais da parte central do carro.

Contava ainda com vidro de comando elétrico separando o compartimento do motorista da parte traseira, rádio com quatro faixas de onda, toca-fitas, apoio móvel para os pés, detalhes de acabamento em jacarandá maciço, vidros escurecidos e, pela primeira vez em um carro nacional, ar-condicionado -- direcionado, naturalmente, ao compartimento traseiro.



O Itamaraty sofria a concorrência interna do Galaxie em 1971, quando a Ford tirou de linha esta versão de luxo e...

Para a versão Especial, que incluía todos esses requintes, era oferecido um toca-fitas de cartucho Clarion com espaço para guardar fitas, controles de luzes internas e acendedor de cigarros, além de um inusitado barbeador elétrico Remington Roll-a-Matic. Essa versão só podia transportar quatro passageiros, pois o banco traseiro era separado por um console fixo, onde se alojava um gravador da marca Sony.

O acabamento, sempre em couro, era oferecido nas cores havana, preto, cinza e branco. A maioria dos modelos saiu de fábrica na cor havana na parte dos passageiros e preta na do motorista. Já a versão básica seguia o padrão de acabamento do Itamaraty, com costuras verticais. Para deixar o carro com ar mais exclusivo, era colocadas nas soleiras das portas duas pequenas placas com os dizeres: "carroceria Karmann-Ghia" e "feito especialmente para...", com o nome do proprietário.

...o Aero-Willys. O motor de 3,0 litros, porém, seria usado dois anos depois no Maveric

A primeira entrega se deu ao presidente da República, o marechal Humberto de Alencar Castello Branco, um modelo Especial. Esse automóvel vinha de fabrica com rádio-transmissor colocado no porta-malas, mastro para bandeiras nos pára-lamas dianteiros e brasões da República nas colunas, além de um televisor e de um velocímetro no console central traseiro.


Ao todo foram fabricadas 27 limusines, sendo dois protótipos, 19 modelos básicos e seis do Especial, a maioria na cor preta. Desse total, a maior parte foi vendida a governantes do País e o restante a empresários. Hoje em dia o Itamaraty Executivo é difícil de encontrar, e os poucos que restam encontram-se nas mãos de colecionadores e em alguns museus. Com todos esses atributos, definitivamente, ele figura entre os maiores clássicos brasileiros.