Páginas

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Alfa Romeu 2300 1975 - Sedã esportivo à italiana

Sedã esportivo à italiana


Desenhado para o mercado nacional, o Alfa Romeo 2300
teve imagem marcante e uma história de pioneirismo



Do motor com duplo comando de válvulas aos pneus radiais, do câmbio de cinco marchas ao desempenho notável para seu tempo, sem esquecer o estilo em sintonia com o do Alfa Romeo 2000 na Itália, o FNM 2000 JK — depois chamado apenas de FNM 2000 e, mais tarde, 2150 — representou um importante marco para a indústria brasileira de automóveis ao ser lançado, em 1960. Decorrida mais de uma década, porém, seu apelo já não era o mesmo.


Nosso mercado crescia a passos largos, chegando à produção anual de meio milhão de veículos. Os novos carros, antigamente trazidos para cá quando saíam de linha nos países de origem, agora estavam atualizados com os do Primeiro Mundo — a General Motors até lançaria aqui, em 1973, o Chevette seis meses antes da Opel alemã. No segmento de carros mais luxuosos, modelos como Ford Galaxie/Landau, Dodge Dart/Charger e Chevrolet Opala representavam o que de melhor a indústria nacional tinha a oferecer. Só uma marca parecia alheia a toda essa evolução: a FNM, Fábrica Nacional de Motores, com seu antigo sedã.


Em vez de trazer um projeto italiano, como o FNM 2000, a empresa desenvolveu aqui o modelo 2300, que estreava em 1974 com inovações como os freios a disco nas quatro rodas
A monotonia, porém, estava por terminar. A empresa sediada no distrito de Xerém, no município de Duque de Caxias, RJ, desenvolvia um sucessor para o veterano 2000/2150, desta vez com desenho individual, não a simples cópia de um modelo italiano. Seu nome traria a aura de esportividade da marca fundada em 1910 em Milão, a Anonima Lombarda Fabbrica di Automobili: Alfa Romeo 2300.


Ao ser lançado, em março de 1974, o novo Alfa brasileiro impressionou. Inspirado no dos italianos, como o Alfetta de 1972, seu estilo refletia as tendências européias da década, com predomínio de linhas retas, ampla área envidraçada e uma traseira alta e imponente. Na frente, os quatro faróis circulares — "marca registrada" da empresa iniciada com o modelo 2000 Sprint — acendiam-se em simultâneo no facho baixo e vinham incrustados a uma ampla grade preta, que trazia ao centro o elemento identificador da Alfa. As laterais eram simples, sem adornos, e as pequenas lanternas traseiras (já com seção em cor âmbar para as luzes de direção, o que só seria obrigatório no País 10 anos depois) acentuavam o tamanho externo do porta-malas.


O novo motor de 2,3 litros tinha, como os anteriores, duplo comando e câmaras hemisféricas; com potência bruta de 140 cv, dava bom desempenho ao sedã

Por dentro, o 2300 exibia um ar esportivo característico da marca, como o volante de três raios metálicos, cujo aro de plástico simulava madeira, e os bancos dianteiros individuais, reclináveis e com encostos de cabeça opcionais. O painel trazia um amplo conta-giros — tradição iniciada em 1960 — posicionado de modo que, no regime de potência máxima, o ponteiro estivesse na vertical para ser notado pela visão periférica do motorista. Outros equipamentos eram manômetro do óleo, lavador do pára-brisa (por bomba de pressão) que acionava o limpador, apoio de braço central no banco traseiro e cintos de três pontos para quatro ocupantes. Rádio com antena elétrica, vidros verdes e ar-condicionado eram opcionais.

A mecânica do novo Alfa conservava a imagem de inovação que notabilizou o JK. O motor de 2.310 cm³ era novo, mas mantinha o duplo comando, as câmaras de combustão hemisféricas e as válvulas de escapamento refrigeradas com sódio, introduzidos pelo JK. Com taxa de compressão de 7,5:1, a fábrica recomendava o uso de gasolina "azul", a de maior octanagem disponível na época. Diante da disponibilidade irregular desse combustível pelo País, optou-se por um tanque com capacidade de 100 litros, uma das maiores já vistas por aqui, o que trazia conveniente autonomia em viagens. E se tornaria um atributo especial anos depois, em tempos de postos fechados à noite e nos fins-de-semana.


O interior do modelo 1975: volante que imitava madeira, ar-condicionado e painel comconta-giros, cujo ponteiro chegava à posição vertical no regime de potência máxima

Ainda pelo sistema de medição bruto, a potência atingia 140 cv e o torque 21 m.kgf. Com o câmbio de cinco marchas calculado para desempenho (velocidade máxima em quinta) e peso ao redor de 1.300 kg, o carro andava muito bem para a época: atingia 170 km/h e acelerava de 0 a 100 em 11,7 segundos, de acordo com a marca. Apesar da cilindrada bem menor, não ficava muito atrás dos brasileiros mais potentes, dotados de motores de seis e oito cilindros, como o Opala 4,1 e o Dodge Charger V8 5,2. A Alfa destacava que, a 135 km/h, o motor usava apenas 50% da potência disponível.


A carroceria usava o conceito de estrutura diferenciada, com zonas de deformação à frente e atrás que se comprimiam em colisões, absorvendo o impacto de que outro modo seria transmitido aos ocupantes. A grande rigidez à torção era outra qualidade. A coluna de direção tinha duas juntas universais, de modo a não comprimir o motorista em caso de impacto. E desde o início o 2300 possuía freios a disco nas quatro rodas, uma primazia entre os nacionais que se manteria exclusiva até o fim de sua produção — só em 1991, 17 anos depois, a GM os usaria no Diplomata!


A um tempo em que banco dianteiro inteiriço e alavanca de câmbio na coluna de direção eram comuns nos carros de luxo, o 2300 adotava o padrão esportivo de bancos individuais, com encostos de cabeça, e câmbio no assoalho
Seu concorrente mais próximo em status era o Landau, também muito luxuoso, mas adepto de uma filosofia diferente, com sua profusão de cromados, dimensões bem maiores, suspensão muito macia e motor com ênfase nas baixas rotações. Enquanto o Ford agradava mais aos adeptos da escola americana, com seus motores V8 de grande cilindrada (4,8 e mais tarde 4,95 litros), o Alfa tinha como alvo os que preferiam modelos europeus. Em preço, porém, o 2300 (Cr$ 45 mil no mês de lançamento) rivalizava diretamente com o Dodge Gran Sedan (Cr$ 49 mil) e o Opala Gran Luxo 4,1 (Cr$ 44,6 mil). O Galaxie 500 (Cr$ 60,6 mil) e o Landau (Cr$ 78,4 mil) custavam bem mais.

ESCRITÓRIO MÓVEL






No Salão do Automóvel de 1977 era apresentado o 2300 Executive, um estudo de como o Alfa poderia receber o máximo de itens de conforto e utilidade. Se por fora era quase igual ao modelo em produção (ganhava apenas pára-choques com cobertura plástica, que seriam adotados muitos anos depois), por dentro impressionava pelo requinte. O revestimento dos bancos usava couro e camurça e os traseiros tinham reclinação elétrica — segundo a Alfa, inédita em termos mundiais. O ambiente era um escritório móvel com rádio faixa-do-cidadão, radiotelefone, televisor, geladeira com congelador, mesas retráteis, gravador e luz de leitura. O motor era o de 165 cv para exportação. Consta que o exemplar único do Executive teria sido destruído após o evento.



"Importado nacional" A proibição em definitivo das importações de automóveis, em 1976, abriu novos mercados para o 2300, que de repente destacava-se como a opção mais próxima dos agora inacessíveis carros europeus. A empresa não demoraria a aproveitar a situação, adotando o mote "o primeiro importado feito no Brasil".


O 2300 ti aproveitava o fim das importações para se promover como um nacional atualizado aos europeus; o motor recebia dois carburadores de corpo duplo e passava a 149 cv
No Salão do Automóvel daquele ano a Alfa apresentava o 2300 B, que assumia o lugar do modelo básico. A tônica era adequar o carro a um leque variado de clientes, que não mais precisariam ser aficionados pela marca e tolerar seus problemas. O interior estava mais luxuoso e agradável, com revestimento aveludado, nova posição dos comandos, painel mais atual com iluminação esverdeada e volante de plástico com ajuste de altura, mais uma primazia. Por fora, as maçanetas vinham embutidas nas portas (seriam usadas por numerosos modelos fora-de-série e adaptadas por proprietários de carros os mais diversos) e a altura de rodagem era reduzida na traseira, com fins apenas estéticos.


Na mecânica, o destaque era a adaptação do motor à gasolina comum ("amarela"), de menor octanagem, embora a taxa de compressão não mudasse. Com mudanças nos comandos de válvulas e coletores, conseguia manter o desempenho original — ou mesmo melhorá-lo, pois passava a 141 cv e 21,5 m.kgf. A suspensão tornava-se mais macia e silenciosa, com novas molas, amortecedores e buchas, e os braços de direção modificados deixavam o volante menos pesado em manobras, atendendo a uma antiga reclamação.


O quadrifoglio -- logotipo com um trevo de quatro folhas -- nas colunas
 traseiras era um dos elementos estéticos do 2300 ti
Meses depois, já em 1977, era adicionado à linha o 2300 ti (sigla para turismo internacional, comum na linha européia da Alfa). Essa versão mais refinada tinha pequenas diferenças externas, como garras de borracha nos pára-choques, luzes de direção no dianteiro (em vez de abaixo dele), frisos cromados na grade e um emblema nas colunas traseiras com o quadrifoglio, o trevo de quatro folhas da marca italiana. No interior, o painel revestido de mogno legítimo trazia um quadro de instrumentos completo, com a adição de manômetro de óleo e voltímetro, e havia luzes-piloto em redundância a quatro dos mostradores. O rádio/toca-fitas ganhava antena elétrica.


Dois dos passageiros do banco traseiro agora contavam com encostos de cabeça, cinto de três pontos (mais pioneirismos), luzes de leitura e cortinas no vidro de trás para proteção solar. Como antes, o ar-condicionado (de série) tinha uma extensão para esses ocupantes. Na mecânica, o destaque ficava para os dois carburadores Solex de corpo duplo e fluxo horizontal — o B contava com um único de corpo duplo e fluxo vertical —, que trazia mais 8 cv e 1,5 m.kgf. Agora havia, portanto, 149 cv e 23 m.kgf, suficientes para chegar a 175 km/h e fazer de 0 a 100 em 10,8 s, de acordo com o fabricante.

Um destaque lançado na versão ti que se manteria até o fim: painel completo, com manômetro de óleo, voltímetro e luzes-piloto redundantes para quatro dos mostradores


Era um bom desempenho, mas ainda não se entendia a insistência da Alfa em usar gasolina comum, se uma superior estava disponível nos postos brasileiros. A resposta vinha no começo de 1978: um motor com taxa mais alta (9:1), a mesma das versões de exportação à Europa, passava a ser oferecido como opcional no mercado interno. Com 163 cv e 24,4 m.kgf, o carro tornava-se mais rápido e bem mais econômico, a ponto de compensar o maior preço da "azul" — o que, de qualquer modo, não era primordial em seu segmento de mercado

Mudança de endereço Em meados de 1978 concretizava-se a aquisição da Alfa Romeo pela Fiat, quando a produção fluminense era transferida para Betim, MG. A compra encerrava uma longa fase de indefinição, durante a qual surgiram hipóteses diversas, da absorção pela Volkswagen ao encerramento da produção do 2300. A mudança de "casa" permitiu melhorar o nível de ruído e a proteção contra corrosão, mas não serviu para reduzir seu preço: em setembro era de Cr$ 225,7 mil para o B e Cr$ 288,2 mil para o ti, perdendo apenas da linha Galaxie/Landau (de Cr$ 253,8 mil a Cr$ 314,6 mil). O Opala Comodoro 4,1 custava Cr$ 173,5 mil, e o Dodge Gran Sedan V8, Cr$ 193,3 mil.



Dos boatos de que sairia de linha ao da absorção pela Volkswagen, muito se especulou sobre o futuro da Alfa Romeo até a compra pela Fiat, em 1978, que levava a produção para Betim, MG

Os modelos 1980 começavam a se render às tendências da época: pára-choques pretos substituíam os cromados e o 2300 ti ganhava uma pintura preta emoldurando as janelas laterais, diferenciando-o do B. Um ano depois vinha a versão a álcool, com 145 cv e 23 m.kgf — números intermediários entre os do B e os do ti4, como passava a se chamar a versão a gasolina com carburação dupla. Apresentado como ti, o Alfa a álcool usava carburador único como o 2300 B e não teve grande sucesso comercial. Outra novidade era a direção com assistência hidráulica progressiva, que se tornava mais firme em alta velocidade, eliminando uma tradicional crítica a sistemas assistidos.


O Alfa estava ainda mais caro: vendido a Cr$ 1,417 milhão em março de 1981, o ti4 só não superava o Landau (Cr$ 1,547 milhão), mas deixava para trás o Ford LTD (Cr$ 1,321 milhão), o Dodge Magnum (Cr$ 1,089 milhão) e o Diplomata 4,1 da GM (Cr$ 1,064 milhão). O preço do 2300 não incluía o revestimento dos bancos em couro e o controle interno dos retrovisores, opcionais. E era o único entre eles sem oferta de câmbio automático.


Grade, lanternas traseiras e pára-choques tentavam atualizar o 2300 para 1985, sem muito sucesso: dois anos mais tarde ele saía de linha, encerrando o ciclo Alfa na indústria nacional
Para 1983 a versão ti4 tornava-se a única disponível, carregando o brasão da marca italiana junto ao exclusivo quadrifoglio. Entretanto, com quase uma década de mercado, o 2300 mostrava claros sinais de desgaste. Uma tentativa de rejuvenescê-lo era feita na linha 1985, que recebia pára-choques envolventes, nova grade dianteira e lanternas traseiras maiores. As mudanças não apenas eram insuficientes para lhe dar um ar de anos 80, como também geravam dissonância com o desenho superado da carroceria.


Em novembro de 1986, diante da contínua queda de vendas e da inviabilidade de substituí-lo por um novo projeto, a Fiat tirava o 2300 de produção e extinguia no Brasil a marca Alfa Romeo, que voltaria quatro anos depois com o 164 importado da Itália. Passava à história o sedã luxuoso e de temperamento esportivo que, durante 12 anos, representou para muitos o melhor automóvel brasileiro.


EM ESCALA

Em 2012 a editora Planeta DeAgostini do Brasil lança 75 modelos colecionáveis juntamente com seus respectivos fascículos, contando a história do automóvel e do respectivo modelo. O modelo produzido pela Ixo Models vem montada sobre uma base de exposição e caixa acrílica de proteção. Rico em detalhes vem com pneus em borracha, frisos e adornos originais dos modelos de época. Aqui o Alfa Romeu 2300 1975, um coração esportivo que cativou o o Brasil e criou uma geração de fãs com nome próprio: "Alfistas", derivado do Alfa Romeu 2000 berlina (sedan em italiano) em vermelho na escala 1:43






Fonte: Carros do Passado